terça-feira, 20 de julho de 2010

Matemágica do Cosmo

Um físico e um matemático depois de um teatro psicodélico, algumas cervejas num bar agradável e uma brisa fria de frente a imagem de uma bela represa. Tal foi o cenário do último sábado, quando conversamos um bocado eu e o Marcelo após o FIT (Festival Internacional de Teatro de S. J. Rio Preto). E como não poderia faltar numa conversa de sábado a noite, depois de algum tempo estávamos falando sobre ciência, cosmo, realidade, filosofia, pseudociência, vida extraterreste, etc.

Engraçado pensar que, embora cresçamos, sejamos capazes de elaborar melhores perguntas e formulemos para estas melhores respostas, as questões que nos intrigam continuam as mesmas, embora as vezes tentamos intelectualizá-las para disfarçar nossa ignorância. Apensar disso, mais uma vez, eu e o Marcelo fizemos aquela conta probabilística da possibilidade de existir vida fora da terra. Acho que muita gente já fez, mas para quem ainda não fez (a conta), certamente se impressionará com ela.

Pois bem, vamos lá. Os números são assustadores, e não vou colocá-los todos aqui, só o que precisamos (estou usando como referência o site do Observatório Astronômico Frei Rosário, da UFMG). A Via Láctea, nossa galáxia, é uma galáxia de tamanho médio, e possui algo entre 200 bilhões e 500 bilhões de estrelas. Ora, é natural se esperar que em torno de cada uma dessas estrelas orbitem planetas, com as mais variadas condições físicas, atmosféricas, químicas e biológicas. Se pensamos que cada uma dessas estrelas tem em média dez planetas e consideramos (de forma muito pessimista) que existem “apenas” 200 bilhões de estrelas na Via Láctea, chegamos ao resultado de 2 trilhões de planetas!! E estamos falando apenas da Via Láctea!

Continuando as contas nesse sentido, se usamos agora o fato de existirem, pelo menos, 1500 bilhões de galáxias, e consideramos que cada uma tem em média (como na Via Láctea) 200 bilhões de estrelas, cada uma sendo orbitada por dez planetas, o total será de dois trilhões vezes 1500 bilhões de planetas. Ou seja, fazendo as contas “por baixo”, existem 3.000.000.000.000.000.000.000.000 de planetas no universo (eu confesso que não sei como se “pronuncia” esse número). E é claro que isso é apenas o que podemos estimar com algum grau de segurança, e os cientistas apostam que existem muito mais que isso. Na verdade, se o universo for infinito, devem existir infinitos planetas no cosmo, embora esta idéia nos faça, literalmente, perder o chão. Deixemos esse papo para outra oportunidade.

Agora, se supomos que em cada bilhão de planetas apenas um tenha condições de existir vida (o que, para mim, parece ser uma estimativa bem grosseira), no sentido de ter as mesmas condições da Terra, reduzimos o número de planetas com possível presença de vida para 3.000.000.000.000.000. Se, por fim, consideramos que a vida se desenvolva em apenas um de cada um bilhão destes planetas, serão 3.000.000 planetas com vida no cosmo (três milhões!). É claro que não sou a melhor pessoa para falar disso, e certamente qualquer outra pessoa faria suas contas usando números diferentes dos meus; sou matemático, não astrofísico, e meu objetivo é apenas brincar com os números para mostrar que, matematicamente, pode-se praticamente garantir a existência de vida extraterreste. Quem nunca se questinou sobre a questão após fazer esses cálculos, que atire a primeira pedra!

E tem gente que diz que ir ao teatro é uma coisa chata...



Referência: http://www.observatorio.ufmg.br/pas08.htm
Dica de leitura: O Mundo Assombrado Pelos Demônios - A Ciência Vista como uma Vela no Escuro, de Carl Sagan.


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P.S.: Embora um pouco fora de contexto, vou deixar aqui o vídeo do Sagan sobre a Terra, que é bem legal. Afinal de contas, se é possível concluir que o universo é tão grande, é da mesma forma possível enxergar o quanto somos pequenos e insignificantes no cosmo.





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terça-feira, 13 de julho de 2010

Acordando o Dragão

Quase todo mundo tem um ídolo, e eu não sou diferente. Na blogosfera, o ídolo do Causarum Cognitio - pelo menos da minhas parte - é o (infelizmente inativo) O Dragão da Garagem, do Alexandre Taschetto e do Widson Porto Reis. É lá, por exemplo, que está o Guia Cético para assistir a "What the Bleep do You Know", que de tão bem feito deveria se tornar documentátio da BBC e musical da Broadway (também pode-se encontrar por lá um guia cético para O Segredo. Leitura imperdível!). E como se não bastasse os caras terem criado este excelente blog, ainda criaram o Projeto Ockham, um portal de ceticismo e curiosidades científicas mais que interessante!

Muito interessante também foi o trabalho apresentado pelo Widson no Congresso Latino Americano de Pensamento Crítico, na Argentina, onde o engenheiro fala sobre a presença das pseudociências na universidade brasileira. No Dragão existem alguns posts onde o Widson fala sobre o congresso, as pessoas que encontrou por lá e o que mais rolou no evento, caso alguém queira conferir um pouco mais. Aliás, vale  a pena conferir cada post desses dois caras, que escrevem muito bem!

Minha idéia original era atualizar os dados levantados pelo Widson e procurar por novos casos onde tivessem presentes práticas pseudocientíficas. Apenas por interesse intelectual? Quisera eu que fosse! Como se pode ver no artigo do Widson, muitas universidade públicas, inclusive universidades de grande prestígio, abusam do dinheiro público pago através de impostos pela sociedade, no sentido que usam suas reservas para financiar práticas não científicas ou sem qualquer motivação intelectual, sem que haja qualquer retorno para nós, sociedade! Mas não vou me deter a discutir sobre o assunto, pois isso está muito bem feito no artigo. Se conseguir fazer esse trabalho de atualização que pretendia, escrevo um artigo original para o Causarum. Enquanto isso, fica o link para o texto do  O Dragão da Garagem, pois a causa é por demais justa. Segurem-se em suas poltronas, caros leitores!

A Penetração das Pseudociências nas Universidades Brasileiras, por Widson Porto Reis

 P.S.: O Anel de Blogs Científicos (ABC) está voltando ao ar, em um novo endereço. A notícia saiu hoje no Twitter do Osame. Para conhecer, acesse: Anel de Blogs Científicos.


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domingo, 11 de julho de 2010

Procura-se um nerd!

Tudo bem, todo mundo sabe ou desconfia: o Causarum Cognitio é um blog nerd (a começar pelo nome) formado por três quase cientistas também nerds. Dois físicos e um matemático! Somos apaixonados por ciência, nos divertimos com piadas que ninguém mais entende, adoramos padrões (mas também adoramos caos) e outras estranhezas científicas; não entendemos o porque das pessoas acharem que matemático é especialista em raíz quadrada e físico é quem trabalha em academia e dá aula de futebol na escola e aí por diante. Mas também nos achamos espertos o bastante (embora exista uma boa chance de não o sermos) para falarmos sobre coisas um pouco além da ciência, como fazemos aqui no blog. E é claro que eu concordo que não andamos postando muita coisa, mas sempre temos a desculpa de não termos tempo (e não temos mesmo) por conta da corrida vida acadêmica dos típicos estudantes de pós graduação. Um de nós é maluco e certamente precisa de ajuda especializada; o outro - embora não seja mulherengo e já esteja no doutorado - é sossegado e diz pra gente relaxar porque sempre acha que tudo vai dar certo (só porque ele quer) e o último é moderado e esperto o bastante para cuidar dos outros dois sem perder seu "quê" de cientista. Lembraram de alguma coisa? É claro que não! Falta-nos um último nerd - de preferência um que não fale com mulheres -, para sermos quase  uma cópia perfeita (bem menos inteligente, apesar de tudo) dos meninos do engraçadíssimo seriado The Big Bang Theory!


The Big Bang Theory é uma série que foi ao ar em setembro de 2007 e narra o dia-a-dia de quatro gênios do Caltech: Sheldon, Leonard, Howard e Rajesh, e o relacionamento dos rapazes com Penny, a garçonete loira vizinha de Sheldon e Leonard, por quem este último é apaixonado. Além da comédia, que é realmente muito boa (pelo menos quando podemos compreender as elaboradas piadas da série), a série mostra o estereótipo típico de muitos cientistas e diverte o público brincando com as manias e costumes esquisitos desse pessoal.

Um pouco menos engraçada e mais famosa que The Big Bang Theory é a consagrada série House M.D., uma série (a meu ver científica) que tem como plano de fundo o método científico, conduzido muito cruamente por Dr. House, o antipático, porém gênio, médico que dá nome a série.



"Dr. House"


Mas o real objetivo desde post não é procurar um nerd (eu apenas achei que esse título seria divertido) , mas sim servir de "post-piloto", como se diz no mundo das séries sobre o primeiro episódio. A idéia é apresentar algumas séries e documentários científicos aqui no Causarum, ou pelo menos algo como uma sinopse  de produções que por vezes não são tão conhecidas, mas que são maravilhosos trabalhos em nome da ciência. A primeira delas será Cosmos, de Carl Sagan, e não poderia ser diferente. Cosmos certamente é a maior e melhor série científica de todos os tempos! Se ninguém nunca ouviu falar em Cosmos, ou em Sagan, fica o convite para o próximo post sobre séries científicas! Em seguida falaremos um pouco sobre a série de Marcus du Sautoy, um membro da Royal Society of London que é responsável por fazer divulgação científica pela instituição, e que será em paralelo aos posts sobre matemática que estou escrevendo (será que alguém está lendo!?).  Mas façamos uma coisa de cada vez. Até a próxima pessoal!


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sábado, 10 de julho de 2010

Matemática, natureza e realidade

Este texto pretende ser uma continuação do meu último post (Onde estão os matemáticos?), e discutir essencialmente o papel da matemática na ciência e suas implicações sobre nossa idéia de natureza e de realidade. Afinal de contas, por que motivos a natureza é representada por leis, fórmulas e teorias que a princípio não teriam nenhum contato com o mundo físico? Antes disso, na verdade, é sensato pensar se faz algum sentido se referir a mundo físico. Ora, se a matemática é fruto do conhecimento e da invenção humana e se somos, pois, seres físicos, constituídos de matéria, como poderíamos criar algo que fugisse a este mundo ao qual pertencemos? A resposta para estas questões não são imediatas e talvez nem exista, mas mesmo assim faço questão de levantar duas teses, embora pretenda defender apenas uma delas. Primeira: a matemática pode não ser fruto da criação humana, ou seja, pode ser algo que sempre existiu, ao qual estamos descobrindo através do tempo e utilizando de acordo com nossas necessidades práticas, com o que pede nossa ciência e nossa tecnologia. Se este for o caso, então temos em mãos algo impressionante, pois estamos desvendando algo intrínseco da natureza, algo mais que uma linguagem. Estamos descobrindo o próprio cerne da natureza, o código segundo o qual os eventos naturais que nos rodeiam acontece. Esse ponto de vista defendem aqueles chamados realistas, em oposição ao intuicionistas. A tese intuicionista, a segunda a que me propus a apresentar, é aquela que diz a matemática foi inventada pelos seres humanos. Mas então, se ela não passa de algo criado para nos servir, por que razão ela é capaz de representar os fenômenos que ocorrem em nossa volta?

Defender a tese intuicionista é tarefa nada fácil, mas como faço parte deste time e ao que parece estou disposto a debater sobre o tema, vou me prestar  a dizer algo sobre isto. A matemática é, ou pelo menos foi no início, algo inspirado unicamente na natureza e nas necessidades diárias. Nossas fontes mais remotas que dizem sobre sua história denunciam que a matemática nasceu da necessidade de se contar as coisas, estabelecer medidas e relações entre objetos. Ou seja, a matemática parece ter nascido e amadurecido inspirada unicamente na natureza.É claro que isso não resolve a questão sobre ter a mesma ter sido criada ou descoberta, mas certamente nos diz que toda a evolução que ela sofreria com o passar dos séculos se deu com base na observação do mundo ao nosso redor, de tal forma que, mesmo que a matemática se voltasse para um campo mais abstrato, a sua essência é indissociável do mundo prático. Sua beleza, ao que me parece, consiste do fato de que ela pode assumir uma forma totalmente abstrata e ir além do que podemos avançar unicamente com nossos sentidos, e neste ponto encontra-se o salto que não podemos acompanhar, que nos faz pensar que ela só pode ser algo além da nosso criação.

Fato é que a matemática se tornou uma ferramenta, e nesse ponto penso em ferramenta unicamente como linguagem, capaz de pensar o infinitamente grande e o infinitamente pequeno, e provavelmente reside aí grande parte de todo o desprendimento da realidade que a caracteriza. Não podemos conhecer todo o universo, nem enxergar os átomos que compõe a matéria, mas matematicamente podemos pensar e escrever um número muito grande ou muito pequeno com a mesma facilidade com que escrevemos o número cinco, ou o número dois, por exemplo. Embora não possamos alcançar muito longe com nossos sentidos básicos, podemos através da experimentação ver manifestações de eventos que ocorrem em escalas muito discrepantes daquela com a qual podemos lidar, e como a matemática concebe tais escalas, somos capazes de estender nosso conhecimento para além daquilo que nos é palpável, mas apesar disso, talvez nos equivoquemos ao dizer que a matemática é algo que não poderia ser inventado.


Matemática e Religião

Alguém que ainda não tenha pensado no assunto pode achar estranho esse subtítulo, mas na verdade a relação entre as duas coisas é mais forte do que se imagina. Na verdade, pode-se facilmente construir uma ponte entre matemática e religão, sendo o pilar que a sustenta a filosofia.Pudera! Antes que sonhássemos com a ciência que conhecemos hoje, eram indissociáveis ciência, filosofia e teologia. Poderia-se inclusive incluir no debate que travamos acima, sobre a natureza da matemática, a religião, e quantos já não o fizeram antes? De qualquer maneira, gostaria de ser mais específico e fazer a seguinte pergunta: por que motivo os matemáticos parecem acreditar mais em deus que outros cientintas? Na verdade, talvez fosse mais natural que acontecesse o contrário, dado o alto grau de racionalismo e ceticismo que carrega consigo cada matemático, mas deixemos essa discussão para o próximo post...


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domingo, 28 de março de 2010

Onde estão os matemáticos?

"O livro da natureza não pode ser lido até aprendermos sua linguagem e nos tornarmos familiares com os símbolos no qual está escrito. E ele está escrito em linguagem matemática, e suas letras são triângulos, círculos e outras figuras geométricas, sem os quais é humanamente impossível compreender uma única palavra e há apenas um vagar perdido em um labirinto escuro."

Galileo Galilei, Il Saggiatore, 1623.

Você não ouve falar neles, não os vê ganhar o prêmio Nobel, não sabe o que eles fazem na universidade, não conhece nenhum matemático famoso e nunca viu qualquer notícia sobre a pesquisa deles nos jornais. Afinal de contas, o que acontece com esse grupo de pessoas que parece uma comunidade mais secreta do que científica?


Na foto: David Hilbert, um dos maiores matemáticos do século XX.


Quem escreve um texto sobre matemática?

Antes de tudo, gostaria que comunicar-lhes agora, caros leitores, que vocês acabam de conhecer um matemático, que é esse que vos escreve (não, eu não sou com computador super avançado capaz de redigir textos engraçadinhos). Sou matemático mesmo, bacharel em matemática, não dou aula em escola alguma e, acredite ou não, faço pesquisa na universidade e recebo para isso. Quer mais? Não me lembro de fórmula alguma que não seja aquela de Báskara e não gosto de fazer contas.  Se achou estranho, vejamos o que você vai achar deste e  dos próximos textos que escreverei aqui no blog. Pretendo mostrar a verdadeira matemática, de forma bem descontraída, e provar que a matemática pode ser muito interessante e curiosa, muito mais do que imaginamos.  Discutiremos a relação da matemática com a física, com a filosofia e até mesmo com a religião. Melhor que isso: pretendo escrever um texto só com aplicações da matemática, onde provavelmente surpreenderei mesmo o mais cético com relação à matemática. Se você acha que logaritmo é uma coisa chata e que não serve para nada, irá se impressionar com as teorias e entes matemáticos muito mais complexos e abstratos que o tal do log que revolucionaram a ciência e mesmo a sociedade.


O que é matemática, afinal?

Para começar, precisamos entender o que é matemática e do que ela trata, ou seja, qual é o seu objeto de estudo, e nesse sentido digo que a matemática é, antes de qualquer coisa, uma ciência. É claro que, como em quase tudo nesse mundo, existem controvérsias. A ciência é regida por um método, o método científico, e esse método nos diz que uma teoria só pode ser considerada uma verdade, pelo menos uma verdade científica, se a teoria puder ser comprovada empiricamente (no laboratório, por exemplo) e reproduzida por qualquer outra pessoa que esteja em condições de fazê-lo. Na matemática não é bem assim, pois todo o conhecimento matemático é abstrato e, dessa forma, não pode ser verificado experimentalmente, fato que poderia classificar a matemática em outra categoria de conhecimento, que não o científico. Mas esta é uma conversa para depois, e os filósofos talvez pudessem nos dizer mais sobre a questão do que nós, cientistas (incluindo os matemáticos).

O fato é que a abordagem matemática é tão ampla que mesmo entre os matemáticos existem divergências sobre o objeto de estudo matemático. Poderia me arriscar a dizer que a matemática é aquela ciência que, baseada na lógica formal, estuda objetos abstratos, analisando a estrutura de tais objetos e procurando padrões, relações entre objetos de natureza distinta. Essa é uma definição complicada e imagino que, dita dessa forma, ela parece ser a coisa mais abstrata nesse momento, mas não é tão complicado assim. As estruturas abstratas a que me referi são, em muitos casos (senão na maioria), inspiradas na natureza, na prática. Além disso, o contrário do que eu disse também acontece, no sentido que a maioria dos objetos estudados pelos matemáticos encontram aplicação prática, se tornando uma solução para um problema de interesse daqueles cientistas ditos naturais, como físicos e biólogos, por exemplo, e talvez por isso vejamos muito mais esses profissionais na mídia do que os matemáticos.  Neste ponto faço questão de grifar o que para mim é o cerne da matemática: ela parece traduzir perfeitamente os eventos que ocorrem na natureza! Tão perfeitamente que por vezes essa estranha relação entre o abstrato e o concreto, o irreal e o real, originam conotações divinas entre os matemáticos, fato que não me admira, mas que me parece uma atitude precipitada, e também pretendo discutir isso adiante, em outro texto. (abaixo, o fractal de Mandelbrot).


Poderíamos aqui dar outra definição para a matemática, desta vez uma definição mais bonita e elegante, embora aparentemente presunçosa, e dizer que a matemática é a linguagem da natureza! Sob a luz dessa charmosa caracterização, explico melhor o disse acima e acabo de repetir: muitos cientistas naturais, aqueles que procuram compreender a natureza e explicar os fenômenos que ocorrem nela, durante o seu trabalho, tem a missão de “matematizar” o seu problema, escrevê-lo em linguagem matemática, construindo o que chamamos de modelo matemático do problema, para que, nesse ponto, possa utilizar das ferramentas desenvolvidas pelos matemáticos para obter os resultados em sua área. Não é a toa que qualquer curso de ciências exatas tem uma porção razoável do rol das suas disciplinas preenchidas por disciplinas de matemática.

 Isso naturalmente explica algumas das perguntas que fiz no começo do texto, como por exemplo, o fato do matemático não ser um profissional popular na mídia. O que acontece é que o papel da matemática, embora fundamental e insubstituível, começa depois do problema ser formulado e termina antes da interpretação dos resultados por parte do outro cientista, e o que nos interessa, o que parece ter relevância no nosso dia-a-dia são as perguntas e, imediatamente após, as respostas, não o meio pelo qual as respostas foram obtidas; ou seja, o matemático trabalha no plano de fundo da investigação científica, fornecendo todo o suporte necessário para que possamos atacar os problemas que surgem na prática, como por exemplo, prever a órbita de um satélite, otimizar processos industriais e minimizar custos, simular as oscilações da bolsa de valores, criar modelos atmosféricos para previsão de tempo, etc, e por isso a matemática é muitas vezes chamada de ciência de base. É claro que existem os matemáticos que trabalham exclusivamente com matemática aplicada, fazendo o papel de outros cientistas, mas apesar disso, ao tratar o assunto, você verá físicos, engenheiros, economistas e até a mulher que dá a previsão do tempo no jornal, mas não verá um matemático

Vale dizer também que não pretendo afirmar aqui que a ciência está a mercê da matemática ou mesmo  fazer qualquer apelo intelectual em nome dos matemáticos frente ao aparente descaso da sociedade por estes. Na verdade, fazendo algo como uma definição alternativa da matemática, ela poderia ser encarada simplesmente como uma linguagem, assim como temos a linguagem escrita para representar as palavras que falamos, e ser incorporada de forma natural à ciência. A questão é que, dado que a matemática parece ser uma ciência independente, autônoma, e se diferenciar das outras por estar substancialmente concentrada no campo das idéias, ela faz previsões e revela segredos da natureza que seriam impossíveis ser desvendados sem ela., e por conta disso faço essa defesa apaixonada da importância da matemática. Obviamente muita coisa está por trás disso tudo, coisas que fogem ao escopo racional/empírico da ciência e recai propriamente sobre a filosofia da ciência, mas trataremos dessas questões nos próximos textos, já que aqui tratamos essencialmente de discutir o que é a matemática, qual a sua relação com outras ciências e qual o papel do matemático nesse contexto. Neles, talvez precisamente em um único texto, faremos outras perguntas nesse sentido e levantaremos questões mais fundamentais como: a matemática foi inventada por nós ou é algo que sempre existiu, independente do homem? O fato de a natureza (que é algo que podemos ver e sentir) obedecer fundamentalmente à leis matemáticas exatas e abstratas pode indicar algum indício de projeção da mesma por parte de um ser superior? Discutiremos brevemente a dualidade realismo-intuicionismo e decidiremos nosso lado nestas questões. Enquanto isso, deixo aqui meu agradecimento pela leitura e o convite para o próximo texto.



*** Farei todo o esforço para que os próximos textos não sejam de leitura mais difícil que este, afim de manter a nossa motivação. Para aqueles que passam aqui no Causarum vez ou outra, peço desculpas em nome dos membros o blog pelas poucas publicações. O tempo está curto, mas continuamos por aqui.

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